segunda-feira, 7 de março de 2011

Aborto no Brasil

José Roberto Goldim


Atualmente no Brasil o aborto é considerado crime, exceto em duas situações: de estupro e de risco de vida materno. A proposta de um Anteprojeto de Lei, que está tramitando no Congresso Nacional, alterando o Código Penal, inclui uma terceira possibilidade quando da constatação anomalias fetais.
Esta situação já vem sendo considerada pela Justiça brasileira, apesar de não estar ainda legislada. Desde 1993, foram concedidos mais de 350 alvarás  para realização de aborto em crianças mal formadas, especialmente anencéfalos . Os juízes inicialmente solicitavam que o médico fornecesse um atestado com o diagnóstico da mal formação, além de outros três laudos para confirmação, um outro laudo psiquiátrico sobre o risco potencial da continuidade da gestação e um para a cirurgia. Ao longo deste período estas exigências foram sendo abrandadas.Em algumas solicitações os juízes não aceitaram a justificativa, e não concederam o alvará tendo em vista a falta de amparo legal para a medida. Em 2000 um advogado entrou com uma solicitação de medida liminar para impedir uma autorização de aborto de bebe anencéfalo no Rio de Janeiro. A mesma foi concedida.
Este tema tem sido discutido desde inúmeras perspectivas, variando desde a sua condenação até a sua liberação inclusive descaracterizando-o como aborto, mas denominando o procedimento de antecipação terapêutica de parto.
A nova redação proposta para o Código Penal, altera todos os três itens, é a seguinte:
    Exclusão de Ilicitude Art. 128. Não constitui crime o aborto praticado por médico se: I - não há outro meio de salvar a vida ou preservar a saúde da gestante; II - a gravidez resulta de violação da liberdade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de reprodução assistida; III - há fundada probabilidade, atestada por dois outros médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis anomalias físicas ou mentais. Parágrafo 1o. Nos casos dos incisos II e III e da segunda parte do inciso I, o aborto deve ser precedido de consentimento da gestante, ou quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro; Parágrafo 2o. No caso do inciso III, o aborto depende, também, da não oposição justificada do cônjuge ou companheiro.
A nova redação proposta pode dar margem a diferentes interpretações. No inciso I, por exemplo, o que é preservar a saúde da gestante ? No âmbito da Medicina as ações visam, em última análise, a preservação da saúde das pessoas. Qual a justificativa para o aborto, tendo por base um critério tão vago ?
Os itens constantes no inciso II também merecem algumas considerações. Esta violação da liberdade sexual deverá ser denunciada e registrada junto a uma autoridade competente ? O ato médico de abortar o feto será realizado somente com autorização formal por escrito de um juiz ? Como caracterizar o não consentimento de uma técnica de reprodução assistida se a maioria dos profissionais que atuam na área ainda não tem o hábito de obter um consentimento informado de seus pacientes ?
A probabilidade, e não o diagnóstico conclusivo de lesões no feto, pode levar a algumas situações bastante delicadas. Os médicos que o anteprojeto de lei se refere devem ter familiaridade com a área de diagnóstico pré-natal de anomalias fetais ? O critério de grave e irreversível anomalia física ou mental está restrito a condição da criança imediatamente após o parto ou pode ser ampliada para situações que irão ocorrer a longo prazo ? Um exemplo disto pode ser o diagnóstico preditivo de Doença de Huntington em um feto. Este diagnóstico, que irá manifestar-se somente na quarta década de vida, constitui um motivo para a realização do aborto ?
 Estas e outras questões devem servir de base para uma reflexão adequada sobre a adequação da realização de abortos eugênicos.

Anteprojeto de Lei que altera dispositivos do Código Penal e dá outras providências.

Nenhum comentário:

Postar um comentário